Terminava o ano de 1963, nas matas do Norte de Moçambique a Frelimo preparava-se para iniciar a guerra colonial, mas mais a Sul, em Lourenço Marques, nessa cidade maravilhosa, calma, alegre, onde na época existia uma atmosfera descontraída, considerada a pérola do Índico, nascia eu.
Ainda muito pequeno, vivi numa pequena localidade chamada Moamba, onde brinquei com alguns meninos “loiros” de origem Sul-africana, foi ali que fui pela primeira vez à escola, onde curiosamente existiam poucas crianças negras. Este lugar era tipicamente colonial, notava-se pelas fachadas das casas, as ruas eram de terra batida e os troncos das árvores que as ladeavam eram pintados de branco, os policias vestiam calções de cor caqui, existia algum comércio, mas predominantemente dominado por “indianos” que tinham emigrado da Goa Portuguesa.
Lembro também as viagens de comboio que fazia com a minha mãe, quando nos deslocávamos a Lourenço Marques, com o comboio a parar à porta da nossa casa, apitar e esperar pelo nosso embarque, é verdade, não estranhem, pois o meu pai era ferroviário e prendava-nos com esta delicadeza.
Recordo-me igualmente das caçadas do meu pai, a chamada caça “grossa”, para mim na época era um fascínio, dos chapéus e vestidos coloridos da minha mãe, dos fins-de-semana com os amigos dos meus pais, das temporadas do meu primo Carlitos lá em casa, muita praia, na Ponta do Ouro ou Bilene, do “mainato” (nome dado em Moçambique aos empregados domésticos) que normalmente olhava por mim, das magníficas sessões de cinema ao ar livre, o chamado “Drive In”, vivíamos muito alegres e felizes.
Num ápice tudo mudou, quando já residia na cidade de Lourenço Marques, pouco tempo depois do 25 de Abril de 1974, tem início a revolta da população negra nos arredores da cidade, as ruas começam a ser invadidas por grupos de pessoas munidas de armas, catanas, pedras, etc, o medo e a desconfiança pelo estado da situação começa a apoderar-se da minha família, começo a ouvir comentar: - A situação está a complicar-se, temos que sair daqui!
Estranha ideia aquela, será que os meus amigos também vão? Posso levar os meus brinquedos, o meu aquário, o meu quarto? Tudo para mim era muito confuso. A estas dúvidas ouvia como resposta: – Não! Isto está muito mau, possivelmente apenas podemos levar algumas roupas e pouco mais! Mas não te preocupes, vais ter outro quarto, outros brinquedos, outros amigos!
Foi tudo muito rápido, Não me lembro de muito mais, apenas da minha chegada a Lisboa em Dezembro de 1975, num dia terrível de inverno, daqueles que eu nunca tinha visto.
O primeiro Natal foi sem prendas, fui para uma nova escola, havia muito frio, conheci novos amigos, não tinha um quarto nem brinquedos só para mim, vivíamos generosamente em casa de familiares, como tudo tinha mudado, desde aqueles dias felizes.
Apesar de ter saído de Moçambique ainda pequeno, recordo aquela época com uma enorme saudade, não me deixando de perseguir o desejo de um dia voltar e de mostrar aquele País aos meus filhos. Bem sei que está diferente, mas com certeza continua a ter o seu encanto, o encanto natural de um local que nunca vai deixar de ser a minha terra.
Embora tudo isto se tenha passado há mais de trinta anos, torna-se para mim muito dificil recordar este tempo, faço-o particularmente para que os meus filhos conheçam esta minha infância.
Ainda muito pequeno, vivi numa pequena localidade chamada Moamba, onde brinquei com alguns meninos “loiros” de origem Sul-africana, foi ali que fui pela primeira vez à escola, onde curiosamente existiam poucas crianças negras. Este lugar era tipicamente colonial, notava-se pelas fachadas das casas, as ruas eram de terra batida e os troncos das árvores que as ladeavam eram pintados de branco, os policias vestiam calções de cor caqui, existia algum comércio, mas predominantemente dominado por “indianos” que tinham emigrado da Goa Portuguesa.
Lembro também as viagens de comboio que fazia com a minha mãe, quando nos deslocávamos a Lourenço Marques, com o comboio a parar à porta da nossa casa, apitar e esperar pelo nosso embarque, é verdade, não estranhem, pois o meu pai era ferroviário e prendava-nos com esta delicadeza.
Recordo-me igualmente das caçadas do meu pai, a chamada caça “grossa”, para mim na época era um fascínio, dos chapéus e vestidos coloridos da minha mãe, dos fins-de-semana com os amigos dos meus pais, das temporadas do meu primo Carlitos lá em casa, muita praia, na Ponta do Ouro ou Bilene, do “mainato” (nome dado em Moçambique aos empregados domésticos) que normalmente olhava por mim, das magníficas sessões de cinema ao ar livre, o chamado “Drive In”, vivíamos muito alegres e felizes.
Num ápice tudo mudou, quando já residia na cidade de Lourenço Marques, pouco tempo depois do 25 de Abril de 1974, tem início a revolta da população negra nos arredores da cidade, as ruas começam a ser invadidas por grupos de pessoas munidas de armas, catanas, pedras, etc, o medo e a desconfiança pelo estado da situação começa a apoderar-se da minha família, começo a ouvir comentar: - A situação está a complicar-se, temos que sair daqui!
Estranha ideia aquela, será que os meus amigos também vão? Posso levar os meus brinquedos, o meu aquário, o meu quarto? Tudo para mim era muito confuso. A estas dúvidas ouvia como resposta: – Não! Isto está muito mau, possivelmente apenas podemos levar algumas roupas e pouco mais! Mas não te preocupes, vais ter outro quarto, outros brinquedos, outros amigos!
Foi tudo muito rápido, Não me lembro de muito mais, apenas da minha chegada a Lisboa em Dezembro de 1975, num dia terrível de inverno, daqueles que eu nunca tinha visto.
O primeiro Natal foi sem prendas, fui para uma nova escola, havia muito frio, conheci novos amigos, não tinha um quarto nem brinquedos só para mim, vivíamos generosamente em casa de familiares, como tudo tinha mudado, desde aqueles dias felizes.
Apesar de ter saído de Moçambique ainda pequeno, recordo aquela época com uma enorme saudade, não me deixando de perseguir o desejo de um dia voltar e de mostrar aquele País aos meus filhos. Bem sei que está diferente, mas com certeza continua a ter o seu encanto, o encanto natural de um local que nunca vai deixar de ser a minha terra.
Embora tudo isto se tenha passado há mais de trinta anos, torna-se para mim muito dificil recordar este tempo, faço-o particularmente para que os meus filhos conheçam esta minha infância.
Depois de ter escrito este pequeno texto, tive muita dificuldade em relê-lo.
VÍTOR CARVALHO
eu tambem me identifico com esta história, é bom que estes testemunhos sejam vistos.
ResponderEliminarjoão M.
Muito bonito e recheado de sentimento.
ResponderEliminarAgora fico a aguardar a Crónica da viagem ao lugar mágico que o viu nascer.
Um Beijinho
Ângela Cabrita
Muito bonito e recheado de sentimento.
ResponderEliminarAgora fico a aguardar a Crónica da viagem ao lugar mágico que o viu nascer.
Um Beijinho
Ângela Cabrita
Um Amigo, do Amigo reenviou-me um email com o endereço deste Blog. Fico grato por isso. A sua história não é dissemelhante de muitas outras e até da minha. Confesso que é com relutância que leio ou veja alguma coisa acerca de África, especificando Moçambique. Hoje que temos mais de 40, pelo menos acima dos 35/36, podem, com a sua "estória" os que viveram, sentir os cheiros, os espaços, as cores, os mimos bem como a crueldade da realidade, com toda a sua violência, a mudança de paradigma. A descoberta de uma família, que ainda hoje acho estranha, a minha capacidade, a de muitos de nós, de incessantemente fazer-mos frente, tentar "agarrar o touro pelos cornos", cairmos, levantarmo-nos e seguirmos. Amadurecemos mais cedo, uns, outros evitaram-no. É evidente que cada um tem a Sua História, Importantíssima (...) é individual. Estas partes todas não conseguem fazer o TODO e no entanto ele está Lá, todinho.
ResponderEliminarUma certeza eu tenho, e creio que também terá, vivemos uma forma civilizacional, um modus vivendi que jamais se repetirá, umas vezes acertada, outras, completamente errada. "Malgrés tous" Fomos, Somos os últimos. Qualquer replicação é uma imitação. Um Abraço
"...Depois de ter escrito este pequeno texto, tive muita dificuldade em relê-lo..."
ResponderEliminarEntendo muito bem aquilo que sente, não é necessáro escrever mais, Parabens.
Um abraço